Minha querida
Inês,
Sinto a tua falta, hoje
mais do que todos os dias anteriores, pois faz um ano que partiste. Deves fazer
ideia do que estou a sentir. Do que desejaria não sentir. Faço um esforço
enorme para secar meus olhos, mas é impossível pois estas lágrimas não param.
Elas escorrem como sangue, e desejo desesperadamente parar de sentir. Mas não
paro. Sinto, sinto-te cada vez mais. Sinto-te neste ar que respiro, entrançando
meu coração em fios de dor. Sinto como se os anjos soprassem no nosso quarto a
essência do teu ser. E assim, deitado entre os lençóis, numa tempestade de
lágrimas, respiro-te. Respiro-te porque adoro-te, respiro-te porque amo-te.
Porque toda a hora anseio-te e espero-te, mesmo sabendo que nunca mais
voltarás.
Hoje vou
ganhar coragem e irei visitar a tua campa. Vou levar-te a nossa primeira foto
juntos, que guardei com especial carinho. Vou levar o teu sorriso, que se
eternizou no meu coração. Também levarei os desejos que te invocam. Levarei as palavras
que me ofereceste, os beijos, os sussurros… Levar-te-ei inteira comigo! Triste
pelas palavras que não falei, pelos olhares que não lancei, pelos momentos que
não realizei. Deixarei teu espírito envolver-me, deixarei me abraçares como o
fizeste no dia do teu sepulto. Meu corpo todo arrepiado, sentindo-te tanto,
criando dentro de mim um vulcão a transbordar lava de saudade. É uma saudade de
ter, de ser, de lembrar, de ver e sentir.
Às vezes me pergunto, porque te amo tanto, ao ponto de não querer amar
mais ninguém? Pergunto na esperança de esquecer a resposta. Mas ela surge
sempre na minha mente. Porque tu me amaste com a mesma intensidade, morreste me
amando, e eu nunca esquecerei isso. Sei que nunca encontrarei alguém que possa sequer
chegar perto do teu amor, alguém que consiga me cativar da maneira que o
fizeste. Serás sempre aquela pessoa que lembrarei antes de adormecer, e a
primeira pessoa que pensarei, assim que despertar pela manhã.
Já revi vezes sem conta o nosso álbum
de fotos. Às vezes passam horas desde que o abro até fechá-lo. Para mim parecem
segundos, pois perco-me no tempo, ao ver desfilar no meu pensamento tantos bons
momentos da nossa vida. E como tu eras linda, meu amor. Tu
eras maravilhosamente linda, mesmo que estivesses de pijama velho e cabelos
emaranhados. Lembras-te daquele fim-de-semana nos Maroços, quando fomos ajudar o
teu pai a regar a fazenda? Estavas com uma camisa xadrez dele, que te ficava enorme,
usavas uns calções de ganga desbotados e calçavas botas de água. E mesmo assim
continuavas linda. Como era bom apreciar-te, sabendo este sentimento cá dentro
te venerando.
Quero que nunca duvides
que continuarei a venerar-te,
continuarei a amar-te, pois mesmo que tenhas morrido para o mundo, vives
eternamente dentro de mim. Quero que em todas as palavras que te escrevo encontres
a minha essência; entendas o meu querer, compreendas o meu sentir, e este
nefasto pensar que me vem agoniando. Aqui, mergulhado em saudades, já tenho as
lágrimas transfigurando meu rosto. Fecho os olhos. É como se estivesses
aqui. Abro os olhos e vejo teu corpo a afastar-se, a fundir-se com o horizonte.
Pareces voltar, mas não; é apenas um avião que atravessa a baía de Machico. Ele chega. Mais tarde partirá. Como tu
partiste.
Não! Tu não partiste!
Estás comigo. Aqui.
Agora. Sempre.
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"Pedaços de mim, Pedaços de Nós" - 3º premiado do VI Concurso Literário Francisco Álvares de Nóbrega - Camões Pequeno
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